O preço de uma escolha
(The price of
a choice / El precio de una
opción)
Por Carlos F. Jr.
Capitulo I- A nova vida
Em uma noite
chuvosa, Carl estava em seu quarto na Rua Macaparana, n° 85, apartamento 24, ele
morava sozinho e, especialmente naquela noite, não ouvia música alguma, Carl
amava ouvir Hugh Laurie durante a noite antes de sua leitura diária, um bom blues o acalmava. Mas como a chuva o
encantava, ele preferiu ouvir os pingos caindo e os trovões, em uma noite
bastante fria.
Nada de assistir
televisão ou ver o celular, depois de alguns minutos parado em frente à janela
admirando a chuva, ele resolveu se deitar para dormir. Assim como de costume,
pegou um livro para ler, apagou todas as luzes do quarto, apenas o abajur do lado
direito de sua cama para iluminar. A leitura estava tão boa que Carl se
recusava a pegar no sono, mas aos poucos seus olhos foram fechando e ele acabou
adormecendo com o livro em cima de seu peito e o abajur ainda ligado. Por conta
da chuva e do frio que fazia naquela noite, ele dormiu tão bem, que nem sentiu
a noite passar rapidamente.
Pela manhã, um belo sol brilhava lá
fora e iluminava todo o quarto. Carl acordou com uma forte dor de cabeça e foi
logo se espreguiçando, abrindo seus braços e pernas, se espojando em sua cama. Quando
abriu bem os braços ele sentiu algo estranho, não era sua cama, nem seu quarto,
percebera ainda que não estava só na cama, existia alguém ou alguma coisa com
ele toda coberta. Um salto repentino da cama ele deu, assustado e desnorteado olhava
fixamente para ver quem ou o que estava em sua cama.
Entretanto, seu salto assustado acabou
acordando a pessoa que estava em sua cama, ela abriu o olho e se descobriu.
Carl olhou sem entender nada.
- Beatriz? O que você faz aqui?
–perguntou Carl surpreso.
Beatriz era sua melhor amiga e por quem
Carl tinha um apreço enorme. Ela olhou em sua direção e sorriu. Levantou-se só
de calcinha, nesse momento Carl virou-se de costas para não a ver despida, ela pegou
a blusa do time de coração dele que estava próximo do abajur e vestiu. Foi até
ele e deu-lhe um beijo em seu rosto.
- Bom dia meu amor, como foi sua
noite? Está melhor? –perguntou Beatriz indo ao banheiro.
- Meu amor? Melhor? O que está
acontecendo aqui? –pensava Carl surpreso com toda situação e sem dizer uma
palavra.
Ela saiu do banheiro e foi para
cozinha preparar o café da manhã deles. Quando Beatriz saiu do quarto, Carl foi
vasculhar tudo para ver se achava alguma explicação do que estaria acontecendo.
Procurou na gaveta, no guarda-roupa, em cada canto do quarto, mas não achou
nada que explicasse o que estava acontecendo ali, nem era seu quarto, como acharia algo?
Depois de alguns minutos Beatriz o
chamou para desjejuar, ele foi até a mesa e os dois começaram a se alimentar. Enquanto
eles comiam ela conversava e ria bastante, perguntando se ele estava bem, em
silêncio Carl ficou.
- Você está tão calado. O que houve?
–Beatriz perguntou.
- Nada, só estou um pouco apreensivo.
–disfarçou Carl.
- Apreensivo com que?
- Não se preocupe, coisas minhas. Mas
me diga, como foi seu dia ontem? –Carl tentou puxar algum assunto a fim de
descobrir o que estava acontecendo.
- Ontem? Você está de brincadeira?
–perguntou Beatriz. – Nós ficamos juntos o dia inteiro vendo filme e a noite
bebemos um pouco. Você está muito estranho! –falou Beatriz com uma cara de
surpresa.
- Eu sei, estava brincando com você.
–falou Carl levantando da mesa. – Preciso sair para resolver umas coisas. –ele
concluiu indo em direção ao quarto.
- A essa hora? –perguntou Beatriz.
- Sim, sim. É urgente, volto logo.
–ele falou saindo as pressas de casa.
Carl desde criança conhecia Beatriz e
mesmo eles sendo muito amigos havia nele uma vontade enorme de casar-se com ela,
não por ser apaixonado, mas por serem bastante unidos e ela ser a única que o entendia
e estava sempre ao seu lado, em todas as horas e situações, eram confidentes
além de tudo.
Ele saiu de casa perplexo com que
estava acontecendo, só queria juntar as peças e entender tudo. Ao andar pela
rua, as pessoas sorriam para ele, acenavam, apertavam sua mão, queriam abraçar,
tirar foto, algumas paravam suas atividades só para vê-lo passar. As coisas
estavam ficando mais loucas do que antes, ele então passou em uma loja e viu um
retrato seu estampando uma camisa preta na vitrine, ele foi até a loja, os
funcionários estavam acabando de levantar as portas.
- Olá Carl? –um dos funcionários o
cumprimentou sorrindo.
- Olá, posso ver essa camiseta?
–perguntou ele apontando para a camisa da vitrine.
- Sim claro. O senhor não gostou dela?
Se quiser nós a tiramos daí. –falou o funcionário.
- Não, não se preocupe. Só quero
vê-la.
Ele pegou a camisa viu o retrato de perto e no
verso estava escrito CARL, O
MELHOR MÚSICO DE TODOS OS TEMPOS!
- Desculpa,
mas eu sou o melhor músico de todos os tempos?
O
funcionário deu um gargalhada.
- Nossa
como o senhor é humilde, parabéns.
Carl ficou
sem graça de perguntar mais, agradeceu e se retirou.
- Primeiro foi Beatriz, agora isso, eu
sou um grande músico. –pensou Carl caminhando pelas ruas da sua cidade.
Desde sua infância, Carl tinha o sonho
de ser famoso e um bom músico. Ele percebeu depois de muito pensar que seus
dois maiores sonhos estavam realizados, sem nenhuma explicação aparente. Ele
estava casado com sua melhor amiga, a quem sempre quis ter como sua esposa e
ainda era um famoso músico. Ele sorriu de felicidade e decidiu parar de
entender tudo aquilo e aproveitar sua nova vida. Ele tirou bastante foto com as
pessoas e sorria por nada, estava cheio de felicidade.
Depois de algumas horas, voltou para
casa e foi ao encontro da sua esposa e a encheu de beijos e ela sorriu
entusiasmada, ela pensava, acho que ele voltou ao normal.
Em toda aquela situação de euforia e
alegria por ter realizado os dois maiores sonhos de sua vida, existia uma
questão que Carl logo veio a refletir, por onde andava seus amigos Paula, Júlio
e Adolf?
Paula era uma menina alegre que fazia
as pessoas sorrirem, uma bela garota e que mesmo fazendo parte do grupo se
sentia um tanto excluída, embora, essa exclusão não existisse de fato, mas ela
sempre esteve ali com eles. Carl era apaixonado por ela desde que se conheceram
e todos sabiam disto, mas ela nunca deu chance alguma para ele.
Júlio era um cara louco que tinha um
coração enorme para ajudar as pessoas, era um bom amigo e que todas as horas
estava disponível para o que precisasse. Carl e ele eram praticamente irmãos,
se conheciam a um bom tempo e desde então não se largaram mais.
Adolf era um cara sincero que fazia um
bem enorme para todos e um grande amigo também. Ele era bem mais apegado a
Paula e a Beatriz, mas ainda Carl e ele se gostavam muito. Eram, assim como
Júlio, praticamente irmãos.
- Beatriz, onde está o pessoal Paula,
Adolf e Júlio? –ele perguntou.
Ela não respondeu. Carl ficou sem
entender e mais uma vez perguntou:
- Onde está o pessoal?
- Não se faça de desentendido!
–respondeu Beatriz baixando a cabeça e silenciando.
Rapidamente ela saiu e foi para o
quarto, para que Carl não fizesse mais perguntas. Ele não entendeu a reação
dela, mas respeitou. Alguns minutos depois ele ouviu Beatriz chorando baixinho
dentro do quarto, ele preferiu não incomodá-la. Então, resolveu procurar por
cada um deles.
Saiu pelas ruas daquela cidade, foi
primeiramente à casa de Júlio, mas lá moravam outras pessoas e eles não sabiam
quem era Júlio.
- Talvez eles nem morem mais nos
mesmos lugares, ou nunca moraram aqui. Estou em outra realidade. –logo pensou
Carl indo a casa de Paula.
Chegando lá, não tinha ninguém e a
casa estava toda fechada e muito velha, com uma placa "Vende-se".
Agora ele não tinha mais para onde ir, Júlio e Paula não estavam em suas casas,
só faltava agora ir atrás de Adolf.
No caminho ele avistou uma mulher que
o olhou fixamente, mas a mulher estava um pouco longe, toda suja e com três
homens ao seu redor, aparentemente estava muito drogada, em meio a multidão
Carl a perdeu de vista e continuou andando e se perguntando quem seria ela.
Durante o percurso até a casa de Adolf
ele ficou com a impressão de que a conhecia, mas não conseguia lembrar, até
mesmo porque ele não conseguiu vê-la direito por causa da distância.
Capitulo II- A descoberta
Carl foi pensando tanto nessa garota
que nem percebeu que havia chagado à casa de Adolf. Ele lá do portão tocou a
campainha. No mesmo momento Adolf pareceu na porta, mas não saiu, Carl se alegrou
e abriu um enorme sorriso.
- Adolf! Quanto tempo. –falou Carl.
Adolf não respondeu e saiu da porta,
Carl ficou sem entender, alguns minutos depois, Júlio apareceu.
- Júlio meu amigo! Que saudade, venha
aqui fora. –pediu Carl.
Júlio, assim como Adolf não expressou
nenhuma reação.
- O que você está fazendo aqui depois
de tudo? –perguntou Júlio.
- O que você está fazendo aqui depois
de tudo? Como assim? O que eu fiz? –questionou Carl. – Eu só queria ver vocês,
estava com saudade. Onde está a Paula? –concluiu.
Quando ele terminou Adolf chegou perto
de Júlio e abriu a porta, os dois deram uma gargalhada de deboche.
- O que o maior músico quer conosco?
–perguntou Júlio com um tom de sarcasmo.
- Não, o que o maior músico de todos
os tempos quer com dois gays drogados? –falou Adolf com bastante raiva. – Não
foi isso que você falou há cinco anos quando foi viajar em sua primeira grande
turner mundial? –concluiu ele.
Carl ficou sem palavras.
- Você esqueceu dos amigos só por
causa da fama e do dinheiro. Só por isso, eu não vou te julgar, mas a culpa foi
sua, toda sua e isso nunca vou perdoar. –falou Adolf apontando o dedo para
Carl.
- A culpa de que? –perguntou Carl.
- Não se faça de desentendido.
–respondeu Júlio. – E pensando bem, vá embora, não nos procure mais. –concluiu
Júlio dando as costas e entrando com Adolf.
Carl foi embora sem expressar nada,
ele viu em seus olhos o quanto estavam magoados, mas ele nem sabia o que havia
feito. Uma coisa chamou muito a atenção de Carl em toda a discussão, todo o
tempo Adolf dizia que a culpa era dele. Culpa de que? O que ele havia feito?
Carl voltou pensando em tudo aquilo
e nada se resolvia em sua mente, pelo contrário, só complicava mais ainda.
Adolf e Júlio agora eram homossexuais e odiavam Carl. Já passavam das 15h, quando ele lembrou da garota que havia visto na rua, então decidiu voltar pelo mesmo
caminho, assim ele poderia vê-la de mais perto.
Chegando perto de lá, ela não estava
mais ali. Carl olhou para os lados e não a avistou, ficou um tanto
decepcionado, mas continuou sua caminhada. Alguns andares acima, aquela moça
passava pela janela de um dos apartamentos, Carl só deveria ter olhado para
cima que iria encontrá-la, o desencontro foi inevitável.
Chegando em casa, Beatriz já estava
bem melhor, deitada no sofá e vendo televisão.
- Precisamos conversar, agora! –Carl
falou bastante sério e assustado ao mesmo tempo.
Beatriz sentou rapidamente assustada
com a reação de Carl.
- O que houve? –perguntou Beatriz.
- O que houve? Eu quem pergunto. O
que está acontecendo aqui? Ontem eu estava no meu quarto deitado e lendo meu
livro com o cair da chuva, acordo casado com você, famoso, com meus amigos
distantes de mim e sem saber o porquê das coisas, estou a ponto de enlouquecer.
–Carl falou quase sem respirar, ainda em pé.
- Calma! Eu irei te explicar tudo,
ou te lembrar. Agora senta e se acalma. –Beatriz falou levantado e indo até a
cozinha pegar um copo de água para ele.
Quando ela voltou, deu o copo a ele,
sentou e continuou:
- Ontem à noite estávamos aqui em casa bebendo um pouco, você acabou excedendo um pouco nas canecas de vinhos e
ficou bêbado, indo ao banheiro você escorregou e bateu forte a cabeça na pia,
mas nada sério, como você estava bêbado tive que te ajudar a tomar um banho e te levar para cama, você apagou rapidamente. Por isso você não lembra de
nada e ta complicando tudo, acho que logo, logo tudo volta ao normal. –explicou Beatriz.
- Eu não quero esperar, eu fui atrás
de Paula, Adolf e Júlio e tudo estava estranho. –falou Carl meio sem jeito.
- Você fez o que? –perguntou Beatriz
irritada.
- Eu te perguntei e você não me
respondeu. O que queria que eu fizesse? –falou Carl alterando a voz.
Beatriz ficou calada.
- Você poderia me explicar o que
houve com eles? O que eu fiz? –Carl pediu se acalmando mais.
Ela permaneceu calada por uns
segundos olhado para ele, então ficou em pé.
- Tá bom, Vou refrescar sua memória.
Preparado para um choque de realidade? –perguntou Beatriz.
Carl apenas balançou a cabeça.
- Há algum tempo atrás quando nós
casamos, éramos ainda aquele velho quinteto de sempre. Unidos, irmãos, sempre
fazendo as nossas bagunças e loucuras juntos, mas os anos foram passando e
acabamos nos afastando um pouco. Você se tornou conhecido como músico, escritor
e compositor. Anos à frente Júlio e Adolf assumiram seu namoro, posteriormente
foram morar juntos, só que você nunca aceitou eles, queria nem olhar para os
dois. Em um dado momento, eles precisaram de uma ajuda sua para comprar um
medicamento bastante caro para a mãe de Adolf, eles não tinham condições de
comprar, porque estavam desempregados na época, você acabou se recusando a
ajudar, por eles serem homossexuais e estarem se drogando às escondidas.
–Beatriz falou, silenciou um pouco e baixou a cabeça. - Você foi tão grosso com
eles e deselegante que desse dia em diante eles nunca mais falaram conosco, a
mãe de Adolf acabou morrendo por falta desse medicamento que você se recusou
comprar. Desse dia em diante Adolf culpa você pela morte de sua mãe. Ainda
lembro aquele dia, você gritando com tanto ódio, expulsando-os com gritos como
se fossem cachorros, os chamando de drogados e gays. Foi terrível! –concluiu
ela.
- Eu? –perguntou um tanto
desnorteado. - Eu não... –Carl baixou a cabeça e não conseguiu falar nada.
Ele ficou perplexo com tudo o que havia
feito, para ele, era difícil acreditar.
- E Paula? –depois de alguns minutos
em silêncio total, ele perguntou baixinho.
- Paula. Ela viajou, passou alguns
anos fora do país e quando voltou era uma pessoa totalmente diferente. Ela se
tornou uma prostituta, viciada. Desde que ela voltou só vinha aqui em casa para
pedir dinheiro e assim se drogar, às vezes, eu tentava ir a casa dela para
conversar e tentar ajudá-la, mas sempre apareciam homens lá para fazer programa
e você me proibiu de ir lá por conta disso. Não queria sua esposa com uma
prostituta miserável. –respondeu Beatriz. – O ponto que ela trabalha é perto da casa dela, em frente da antiga escola de música. –concluiu.
Justamente onde Carl passou indo a
casa de Adolf e onde viu aquela moça, ali ele percebeu que ela era Paula.
Beatriz não estava feliz com sua vida, ela não tinha mais ninguém consigo a não
ser Carl. O brilho em seus olhos não eram os mesmo de antes, uma tristeza
tomava conta de si, ela demonstrava que estava ali só por obrigação.
Uma vida dos sonhos para Carl e para
seus amigos um pesadelo. Antes de dormir, em sua outra vida, todos do grupo
sabiam que Carl era apaixonado por Paula e sabiam o tanto que ele se preocupava
com ela.
Ele falou com Adolf, Júlio e
Beatriz, conseguiu ver em cada um suas magoas e infelicidades, mas Paula não,
ele não tinha encontrado com ela ainda. Queria ver com seus próprios olho o que
ela havia se tornado, para ele era difícil acreditar que Paula agora era uma
prostituta.
Beatriz depois da conversa foi tomar
um banho, Carl ficou sentado em silêncio pensando em tudo o que havia escutado.
Alguns minutos depois o telefone toca.
- Alô! –atendeu Carl.
- Alô, Carl?
- Sim, quem fala?
- Aqui é França.
- Quem é França?
- Você está de brincadeira? Não
tenho tempo para isso. Preste atenção, fomos convidados para fazer um concerto
hoje a noite, as 22h, algo simples, acabei de fechar um cachê recheado. Você
vai tocar só alguns minutos, 30 minutos para ser mais exato. Tudo bem?
- Sim, claro.
- Ok, até a noite. –falou França
desligando o telefone.
Carl esperou Beatriz sair do banho e
perguntou quem era França. Ela explicou dizendo que era seu empresário e o
braço direito dele. Ele notou que tinha um show para fazer naquela mesma noite,
mas como tocar sem nem saber o que? Nessa nova vida, ele era avisado dos shows
horas ou minutos antes, como ele já estava há algum tempo com sua Turner, era
fácil tocar o de sempre, sem precisar de ensaios.
Mas para Carl nada daquilo era
importante, só o que Beatriz tinha contado. Ele estava pensando em seus amigos
e era isso que mais importava. Tinha que fazer uma escolha dura, continuar com
seus sonhos e deixar seus amigos em situações desfavoráveis ou abrir mão de
tudo.
Mesmo com tudo, Carl não sabia fazer
as coisas voltarem ao normal, até porque ele nem sabia como tinha chegado ali.
Ele pediu a Beatriz o endereço de Paula, disse que tinha esquecido e queria
conversar com ela. Beatriz deu o endereço, Rua Macaparana, n° 85, apartamento
24. O endereço era onde ele morava antes de tudo isso.
Capitulo III- O encontro com
Paula
Já estava próximo à hora do concerto na
sua cidade, faltavam umas 2h mais ou menos. Ele se preparou, falou a Beatriz
que ia na frente, pois precisaria resolver alguns assuntos e que ela fosse
depois, lá iriam se encontrar, Beatriz o acompanhava em todos os seus eventos.
Então, ele saiu. Nem estava se importando com esse concerto.
Antes de ir ao seu concerto, foi ver Paula, ele
precisava disso. Chegando ao prédio, ele subiu até o apartamento dela, chamou
umas duas vezes, mas sem resposta. Ela poderia não estar em casa, pensou ele.
No entanto, o som estava ligado
baixinho, Chandelier da Sia, era a canção que estava tocando
naquele momento, ele chamou mais uma vez e outra vez sem sucesso, ele resolveu
arrombar a porta para ver se ela estava lá, se ela estava bem. Dois chutes
foram o suficiente para o ferrolho da porta quebrar e ele poder entrar.
A vizinha de Paula viu um homem
arrombando a casa e logo chamou a polícia. Ele entrou lentamente e chamando por
Paula, passou pela sala, pelo primeiro quarto, não viu ninguém, mas percebeu
que o apartamento estava uma bagunça, cheio de roupa no chão, papel por todos
os lugares, preservativos abertos e fechados jogados por todos os cantos,
bebidas aos montes.
Chegando mais dentro, na cozinha, uma
surpresa, ele viu Paula no chão, aparentemente desmaiada em decúbito ventral, com várias seringas e
frascos de droga ao seu redor. Ele se desesperou e foi tentar ajudá-la, gritou
por seu nome, balançando-a e quando virou sei corpo, viu que seus olhos estavam abertos e
ela não respirava, sua boca estava cheia de espuma.
- Paula! Paula! Paula! Paula! –gritava
Carl sem nenhuma resposta dela.
Ele
percebeu ali que ela tinha tido uma overdose e não estava mais viva... Carl
chorou abraçado com o corpo de Paula e ligou para a ambulância, ainda meio
desnorteado sem acreditar naquilo, ele saiu do apartamento dela chorando bastante
e foi para rua. Em um instante começou a chover bastante.
- Eu quero voltar, eu quero voltar, eu
quero voltar!!!! –Ele gritava desesperado na chuva.
Capitulo IV- O despertar
Querer voltar
e voltar eram coisas totalmente diferentes. Carl só queria dizer a Paula tudo o
que sentia e pensava, mas nunca teve essa coragem.
- E se eu não
tivesse me afastado dela? E se eu tivesse dito tudo o que sentia? Ela poderia
estar viva, ela poderia não ter feito as escolhas que a levaram a isso. A culpa
é minha! –pensava Carl desolado e querendo não acreditar no que havia
acontecido com ela.
Mas no final, ela de fato havia morrido. As lágrimas de Carl eram sinceras e verdadeiras,
todavia, lágrimas não poderiam mudar os fatos, nem as escolhas.
Enquanto isso, Adolf e Júlio estavam
roubando uma loja ali perto, eles não conseguiam controlar o vicio e não tinha
dinheiro. A viatura que estava indo a casa de Paula passou na mesma hora e viu
os dois cometendo os crimes, foi uma prisão rápida. Os policiais colocaram os
dois algemados dentro da viatura e continuaram para a ocorrência.
Aquela chuva
ficava cada vez mais forte. A morte de Paula foi, talvez, a peça fundamental
para ele querer de verdade voltar, ele não queria estar longe dos amigos, ele
não queria que eles fossem drogados, ele não queria que eles vivessem daquela
maneira, ele não queria mais viver aquela vida que não era dele, ele não queria
perder Paula, não daquela maneira. Mas como fazer para voltar? Ele nem sabia
como tinha chegado ali, imagina como sair! Com uma vontade incessante de
voltar, mas sem saber como, Carl se ver sem saída.
Neste instante
ele estava desesperado na calçada em frente ao prédio onde Paula morava, chovia
bastante igual o dia em que ele lia seu livro no quarto, Beatriz estava indo ao
concerto apressada, pois já estava próximo de começar e ela havia se atrasado um
pouco.
Naquela mesma
rua a viatura já havia chegado e Beatriz estava vindo, por causa da velocidade
e da forte chuva ela perdeu o controle do carro e quase batia na viatura, mas
ela conseguiu desviar e acabou invadindo a calçada onde Carl estava, o
atingindo em cheio. Ele não chegou a ver o carro, só uma luz bastante forte. Um
grito se ouviu naquele instante, Adolf e Júlio viram tudo de longe.
Então, Carl se
acordou assustado com a luz do sol invadindo seu quarto pela janela e batendo
em seu rosto. Ele foi se acalmando aos poucos, quando percebeu que estava
novamente em seu apartamento, sozinho e com o livro em cima da cama, o título
daquele livro era ‘Sonho, o peso das realizações’. Ele notou
que tudo não passara de um mero sonho ou um terrível pesadelo...
Epílogo
Depois do sonho, Carl se viu mais
apegado a todos os seus amigos, as conversas, sorrisos, brincadeiras, até
mesmo, as brigas eram mais intensas, ele decidiu viver tudo com eles mais
intenso, um dia após o outro. Ele não contou a seus amigos sobre aquela noite, guardou
como um segredo. Ainda no mesmo ano, Júlio e Beatriz assumiram um romance um
tanto inusitado, pois ninguém do grupo esperava. Acabou durando alguns anos e
terminaram.
Muitos anos se passaram e Carl já
havia esquecido da noite e de seu sonho maluco. A vida por si só, fez com que
eles se afastassem para que cada um seguisse seus sonhos e ideais, mas as
circunstâncias dessa louca vida acabaram por fazer com que ele se lembrasse de
sua noite. Da forma mais natural possível, aquele sonho foi aos poucos se
tornando verdade, claro que, nem tudo foi perfeitamente igual, mas a maneira
como tudo ocorreu encontraram-se como em um encaixe perfeito de vidas.
Mesmo tendo um pequeno romance com Beatriz, Júlio
se assumiu homossexual mais tarde, entretanto, manteve uma maravilhosa relação
com todos os seus amigos, inclusive Carl, eles ficaram bem mais unidos depois
dos anos. Costumam dizer que são e serão sempre melhores amigos.
Adolf da mesma maneira, buscou coragem mais tarde,
assim como Júlio, e também se assumiu homossexual. Sua mãe não teve nenhuma
doença mortal e eles vivem juntos até hoje. Uma relação maravilhosa entre filho
e mãe. Continua com a velha amizade com o grupo, tentando sempre fortalecer os
laços em cada reencontro.
Paula, a doce Paula de fato, acabou se afastando do
grupo depois dos anos, matem um contato raro com o pessoal, a boa notícia é que
ela não se tornou prostituta, muito menos drogada. Busca cada vez mais a
realização profissional e realizar seus sonhos um a um sem hesitar. Acabou
casando e está vivendo esta vida tão curta, tão efêmera, tão dura e ao mesmo
tempo tão feliz.
Beatriz foi sempre a mesma pessoa contente,
entusiasmada e a amizade com Carl só fez crescer cada vez mais, assim como com
Adolf e Júlio. Estuda bastante e tem sonhos a realizar, sem pressa, mas sempre
em frente, pois não há tempo para perder. Mesmo sem Paula, ainda continuam se
encontrando e relembrando os velhos e bons tempos com boas gargalhadas.
Carl aos poucos foi conquistando seu espaço como
músico, escritor e compositor. Ainda não é ‘o maior de todos os tempos’, mas
com suor e trabalho pode chegar lá, com certeza. Vive sua vida ainda naquele
apartamento de sempre, onde pertenceu a Paula em seu louco sonho. Lá na Rua Macaparana,
n° 85, apartamento 24.
Esses acontecimentos acabaram por lembrar a Carl
seu sonho, sua noite. Ele estava sentado ao lado da Igreja daquela cidade,
lembrando dos seus amigos, pensando nos acontecidos e no sonho, ele se
perguntava como as coisas tinham acontecido assim, Júlio e Adolf realmente
viraram homossexuais; Paula se afastou; Beatriz ficou e ainda está junto a
todos. Então ele sorriu, sozinho, olhando o céu bastante estrelado na cidade
que ele tanto amava, feliz pelas cosias ruins não terem acontecido, mas um
tanto angustiado pela distância de Paula do grupo. Ele entende sua ausência e
fica feliz por suas realizações.
Então, Beatriz chegou, ele a olhou bem fixamente e
lá no fundo dos olhos dela um brilho diferente aconteceu. Aquele olhar de
tristeza não existia, mas sim, um olhar vivo e feliz. Foi ali que ele descobriu
que era Beatriz, que era ela de verdade, a pessoa que ia estar ao seu lado para
sempre, ou que pelo menos era o que ele queria.
-Por que você está olhando tanto para mim?
–perguntou Beatriz.
- Nada! –respondeu Carl dando um largo sorriso.
Ele a abraçou, como de costume, e foram andando
juntos sorrindo e conversando. Mal sabiam que tempos à frente iriam formar uma
bela família.
Fim!
Título: O
preço de uma escolha
Autor:
Carlos F. Jr.
Ilustração:
Carlos F. Jr.
Epílogo:
Carlos F. Jr. / Rossana Maximino
Categoria:
Drama
Local:
Recife-PE
Ano: 2016
